4 de mai. de 2008


Desperte o interrese do seus alunos em poesia
Professores relatam como usam materiais de apoio da Olimpíada de Língua Portuguesa para despertar o interesse de seus estudantes pela poesia
A aplicação em sala de aula do material de apoio, que será distribuído às escolas públicas de todo o país, para despertar o interesse dos estudantes pela poesia, pode esbarrar no desequilíbrio de repertório nas salas de aula. A apreciação de poemas escritos pode ser vista como impenetrável a quem, por exemplo, teve alfabetização capenga. Professores que sentem tal dificuldade na pele aprendem na sala de aula a contornar o problema de forma muitas vezes criativa. Chegam, por exemplo, a aprimorar as orientações contidas nos materiais de apoio do projeto que inspirou a Olimpíada de Língua Portuguesa.
Foi com a ajuda de cantadores nordestinos que as professoras Joana D'Arc Pereira da Silva, de Crato (CE), e Maria Josélia Pereira de Araújo, de Pesqueira (PE), enriqueceram o conteúdo de orientação ao professor do concurso de redação Escrevendo o Futuro, realizado pela Fundação Itaú Social desde 2002 e que agora ganha escala ao inspirar a iniciativa do MEC, a primeira Olimpíada de Língua Portuguesa.
Este ano, o projeto das duas não só integra a primeira maratona do gênero no país como recebe a chancela do Ministério da Educação.
Em 2002, Josélia tomou contato pela primeira vez com o projeto do Itaú Social. Ela lecionava para alunos do 6º ano (antiga 5ª série), além das classes do 4º ano, na Escola Intermediária Maria Aliete de Freitas Macedo, em Pesqueira. A missão de ensinar o gênero poesia foi dura, já que a turma sofria com falha anterior: problemas graves de alfabetização.
Foi aí que ela teve a idéia de tornar a poesia mais próxima da realidade daqueles meninos por meio do canto entoado na região. Chamou um poeta local para explicar as várias estruturas possíveis de rimas e demonstrar que o gênero não era tão difícil assim de ser trabalhado.
- Antes eu tinha dificuldade de estimular a produção deles. Com o projeto, a evolução de todos foi visível - explica.
Três anos depois, foi a vez de Joana D'Arc, hoje com 27 anos de magistério, ter iniciativa similar e chamar artistas da cidade para sua sala de aula. A atividade foi tão bem absorvida pelos alunos que levou à classificação (em segundo lugar no país) da aluna Camila Felix da Silva, aluna da escola de Ensino Fundamental Estado da Paraíba, na qual a professora leciona.
- Além de facilitar o ensino, chamar os artistas locais para a sala de aula é uma forma de dar credibilidade a eles - explica.
Fora da realidadeAssim como Josélia, outros professores também sentiram os percalços da alfabetização falha. No município de Franco da Rocha (SP), o professor Luiz Cássio Bordim, conhecido por Gijio, descobriu logo nas primeiras aulas com o material de apoio do Escrevendo o Futuro que seus alunos da E. E. Zilton Bicudo Professor não tinham consciência do conceito de poesia.
- Estamos aqui em um bairro carente, cheio de necessidades e, apesar de o tema ser "O lugar onde vivo", os alunos não conseguiam transpor isso para o papel. As poesias criadas nesse primeiro momento não refletiam a realidade deles - conta.
Com o apoio do professor e depois de muito treino escrito, os estudantes entenderam que uma poesia pode retratar, sim, as adversidades do cotidiano, e não só amizade, amor e beleza, como acreditava a maioria, recorda o professor.
Para estimular a produção, Gijio fez questão de usar poemas produzidos na escola para exemplificar pontos positivos da criação, como coerência, encadeamento adequado de rimas e criatividade.
- No começo, eles ficavam assustados com os poemas consagrados. Aí tive a idéia de usar o material produzido por eles próprios - conta.
O empenho do professor garantiu a classificação da aluna Yasmim Conceição Alves, em 2006, no Escrevendo o Futuro. A poesia da aluna, que ainda estuda na Zilton Bicudo, foi a campeã no Estado de São Paulo e ficou entre as sete melhores no país.
Professor no banco da escola O material do concurso estimulou muitos professores a refletirem sobre o seu conteúdo programático de aulas. Nas oficinas de formação dos docentes, muitos perceberam que deixavam a desejar e poderiam aprofundar-se no tema poesia.
- Com o material nas mãos, percebi que estava ensinando da maneira errada. Também percebi que minha bagagem era limitada. O projeto abriu novas possibilidades de ensino - conta a professora Maria Josélia, de Pesqueira.
- Antes do Escrevendo o Futuro, acho que nem eu mesmo gostava de poesia, quanto mais trabalhar com ela em sala de aula - conta Gijio, de Franco da Rocha.
Hoje, o professor planeja, para o futuro, conseguir patrocínio para reunir em livros, todo ano, as poesias produzidas pelos alunos. O objetivo é ter um registro que poderá demonstrar a evolução do bairro a cada livro.
Já Joana D'Arc decidiu expandir a experiência e, ao lado de outra professora de Crato e com o apoio da secretaria Estadual de Educação do Ceará, trabalha a formação de 150 professores da rede.